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Mostrando postagens de 2012

Tempo

Mudanças climáticas à parte, quando chega o final do ano sabemos o tipo de verão que teremos. No ano passado, chuvoso e ameno (para o meu gosto, frio!); neste, quentíssimo e, por enquanto, não tão chuvoso. Traduzindo: tem feito um calorão e este é o assunto obrigatório do paulistano da hora que levanta até deitar para dormir (se conseguir, pois ar condicionado e ventilador não costumam ser artigos de primeira necessidade por aqui e poucos os têm em casa). Falar do tempo é tão compulsivo que chego a acreditar que, se não houvesse alteração de temperatura e umidade, não teríamos como puxar uma conversa. As subidas e descidas nos elevadores, as várias esperas - do carro no estacionamento ou do ônibus/metrô/trem nas estações, da fila do banco, da consulta médica – seriam um tédio solitário. Talvez isso não valha para a nova geração que enterra a cara em seus equipamentos eletrônicos e para quem tanto faz se houver um tsunami do lado de fora. O assunto também é ótimo quando não

Tietê despejado

Notícias dão conta que a Prefeitura deu prazo até 16 de novembro para o Clube de Regatas Tietê deixar sua sede na av. Santos Dumont com Marginal Tietê. Não tenho como avaliar se a medida é justa ou não, afinal o espaço é público e o clube é privado (ou pelo menos privativo para seus sócios). Isso não impede que sinta uma tristeza profunda pelo lugar em que passei os melhores momentos de minha infância e adolescência. Ser sócio de um clube em São Paulo é uma maneira de pertencer a uma comunidade, ter um lugar para ir quando não se tem nenhum lugar para ir. Isso era verdade absoluta para quem crescia na Zona Norte nos anos 1970, quando o único parque era o Horto Florestal (e ficava longe) e as praças eram praticamente inexistentes (aliás, não sei se a situação mudou muito, apesar do Parque da Juventude...). Tudo bem, a rua ainda era uma alternativa, mas o aumento do movimento de carros já fazia as mães preferirem os filhos em casa vendo televisão. Quem podia ‘ter’ um clube, era um

A USP vai desaparecer...

O alerta veio do meu marido, André, outro dia quando olhava pela janela do quarto: “Você viu o novo prédio que estão construindo? A USP vai sumir da nossa visão...” Mesmo tendo precedentes, a notícia me entristeceu. É a última réstia de horizonte do alto do meu décimo quarto andar na Vila Madalena. Em uma cidade onde a especulação imobiliária expulsa moradores e incrementa o trânsito sem dó nem piedade, falar sobre direito à paisagem parece conto da carochinha. Já sei que a única coisa a fazer é me conformar. No apartamento que morei antes deste, na Água Fria (bairro da Zona Norte na parte alta de Santana), em cinco anos vi uma panorâmica de 180º - que ia da Zona Leste ao Pico do Jaraguá - desaparecer atrás de três edifícios. Primeiro sumiu o Anhembi e o Centro, junto com nossa privacidade, a partir dali sujeita à sacada do prédio em frente. Logo depois, foi a vez da Zona Leste e sua imensa planície sumirem do mapa. O pico da Jaraguá desapareceu duas semanas antes de nos mudarmos

Barulho onipresente

O bem mais precioso para um paulistano é o silêncio, embora tenhamos apenas uma vaga ideia do que ele seja. Mesmo os maiores exercícios de abstração são insuficientes para lembrar o que pode ser isso. O barulho, por vezes (como agora) ensurdecedor, é como um metrônomo a nos manter no ritmo que a cidade impõe, mesmo que seja parado no trânsito ou tentando dormir. Daqui do meu espaço de trabalho, por exemplo, tenho da janela uma visão rara de árvores e jardim. Estou longe da rua e o ambiente é tranquilo e ideal para pensar. Mas... há uma obra nos fundos. Desde que me instalei no local, há dez meses, um prédio enormemente desproporcional ao entorno está sendo erguido e dá uma sensação de vertigem a quem se aventura na horta do quintal. O barulho, porém, é ininterrupto, sinfônico, onipresente. A metrópole tem som e cheiro. Sentada no café da Casa das Rosas outro dia, curtia o burburinho das pessoas conversando nas outras mesas, o tipo de som gostoso para embalar um café. De re

Pobres árvores

Vida de árvore paulistana não é fácil. Não bastasse terem de se submeter às necessidades da fiação, que as condenam a uma vida de mutiladas, e das calçadas, que deixam suas raízes cimentadas, elas ainda são sempre consideradas obstáculos – seja aos pedestres nas mesmas calçadas, seja às inúmeras obras públicas e empreendimentos imobiliários. O importante é que, seja qual for o motivo, elas sempre levam a pior. Até quando são “esquecidas”, elas se tornam um objeto bizarro. Em uma nova avenida que está sendo construída no Morumbi, a empreiteira contratada pela prefeitura asfaltou a via com 20 árvores no meio (FSP, 3/10/2012, p. C8)! A justificativa é que a própria prefeitura não autorizou ainda a retirada das árvores. Mesmo não aberta oficialmente, a avenida já vem sendo usada por motoqueiros para fugir do trânsito. Se algum acidente ocorrer, todo mundo já sabe de quem será a culpa: da árvore. É essa também a percepção quando árvores debilitadas (por fios, falta de espaço para a

1984

Quando instalaram câmeras nos elevadores do meu prédio – e olha que fomos pioneiros! – a diversão dos meus filhos era ficar fazendo micagem pra elas. Mesmo bem pequenos, eles se sentiram agredidos por serem vigiados e esta era uma forma de protestar. O tempo passou e hoje acredito que praticamente não haja elevadores sem câmeras, flagrando briga de vizinhos e esposa fugindo com marido em pedaços guardados em malas. Na maior parte do tempo, porém, continuo achando que apenas ajudam os porteiros a passar o tempo e se divertir com as inevitáveis indiscrições das pessoas que, acostumadas com o treco, esquecem que ele está lá. As câmaras passaram a fazer parte de nossas vidas também do lado de fora dos prédios e, justiça seja feita, têm ajudado a reconhecer ladrões, brigões e motoristas bêbados ou imprudentes soltos por aí. Também estão em lojas, restaurantes e quase todo espaço público que podemos imaginar. Como bandido não é bobo, a tendência é que cada vez menos exemplares da espé

Vamos ficar um dia sem carro?

A entrada quase inimaginável de novos carros no trânsito paulistano já faz com que sábados tenham picos de congestionamento. Daqui a pouco, teremos que ter rodízio também aos finais de semana! Tudo isso para comentar que neste próximo sábado será 22 de setembro, que é o Dia Mundial Sem Carro. Da última vez que data caiu neste dia, esperei conseguir reparar nas ruas da cidade algum indício de que as pessoas estavam aderindo à data, visto que durante a semana realmente é mais difícil cumprir compromissos com as dificuldades já conhecidas de deslocamento na cidade. Naquela ocasião, não me lembro há quantos anos exatamente (uns 4 ou 5?), fomos a pé para o clube e, sinceramente, não vi diferença nenhuma, já que o trânsito ainda costumava ser tranquilo nesse dia da semana. Agora, na era das bikes e das ciclovias de passeio, pode ser que a história seja diferente: a prefeitura já anunciou que as ciclovias dominicais estarão funcionando também no sábado. Será que teremos a oportunidade

A nova praia de paulistano

Há muito que ouvimos que praia de paulistano é shopping center. Não que seja mentira, já que os guapos não param de ser inaugurados nos quatro cantos da cidade e, que eu saiba, só ficam vazios os que a prefeitura interdita. Mas, de uns tempos pra cá, um novo programa nos têm atraído. E quanto mais atrai, mais se propaga e provoca outra mania paulistana: as filas. Refiro-me aos múltiplos eventos culturais que se chegam à cidade. É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que os finais de semana têm sido curtos para poder acompanhar pelo menos uma parte do que se gostaria. Como para referendar isso, no início do mês, São Paulo foi incluída entre as 12 principais cidades culturais do mundo, em um relatório encomendado pela prefeitura de Londres que avaliou 60 indicativos nas áreas de literatura, cinema, artes, visuais, espetáculos entre outros. Se já nos aprazíamos de ser capital gastronômica do país (até restaurante entre os melhores do mundo nós temos!), também podemos assistir a m

Culto à misoginia*

Travestido de estiloso e moderno, por trazer pseudoinovações (Guimarães Rosa foi bem mais eficiente, já que usar só caixa baixa não é exatamente um grande achado estilístico), o livro “o remorso de baltazar serapião”, de Valter Hugo Mãe, é um culto à misoginia. O autor tenta disfarçar o intento, ao mostrar a vida como dura e sem sentido para todos os personagens, mas o prazer com que descreve (em primeira pessoa, através de seu bronco personagem) os atributos físicos, fisiológicos e intelectuais femininos da forma mais torpe que já vi na literatura é inegável (nem Nelson Rodrigues conseguiu chegar perto, coitado!). O livro é premiado e elogiado por Saramago etc., mas curiosamente não encontrei uma resenha sequer escrita por mulher. Todos os elogios citam a misoginia do texto, mas parecem ter caído na armadilha de ser esta mais uma das dores do mundo e não “A” fonte de inspiração do livro, cuja centralidade na vaca não deixa dúvidas. Um exemplo, que parece chegar perto da ques

Propaganda eleitoral

Não deveria ser assim... mas é. Assistir à propaganda eleitoral gratuita na TV é quase um programa para o paulistano. Um programa ‘tipo’ comédia; em alguns momentos, comédia de horrores. No último sábado, nos prostramos para ver o desfile de candidatos a vereadores e a diversão da família era enumerar os nomes mais bizarros, os mais feios (por que será que todo mundo fica horroroso nestas propagandas?) e as profissões: quantos ex-jogadores de futebol, ex-cantores, professores, pastores etc. Aliás, estas são praticamente as únicas informações passadas nos poucos segundos de exposição. Como é possível diferenciar alguém em meio a tanta alegoria? Infelizmente, o quadro se repete quando o foco está com os candidatos a prefeito, como pudemos comprovar na segunda-feira. Os mais divertidos são os nanicos de sempre. A previsibilidade tanto dos ultradireitistas quanto dos ultraesquerdistas é de matar. Lá estão os primeiros a defender os bons costumes e as grandes obras e os segundos a mo

Ansiedade do rodízio

Todo paulistano que dirige já deve ter passado pela ansiedade do rodízio, um tipo de mal nativo que acomete aqueles que saem com o carro no dia do rodízio e têm que estar em casa até às 17 horas. Calcula-se direitinho quanto tempo se leva no caminho e se dá todos os acréscimos necessários ao trânsito imprevisto (que de imprevisto realmente não tem nada, pois sempre aparece). A alteração comportamental começa ainda durante o compromisso em que se está, pois como manda a tradição, nada começa exatamente no   horário e, quanto mais a hora fatídica de sair se aproxima, sua concentração vai toda para ensaiar a melhor maneira de avisar os demais que terá que sair antes de terminar. Mas é na hora que você está no carro e o congestionamento se materializa que vem aquele friozinho na espinha, que começa com o arrependimento de ter tirado o carro de casa, depois com a culpa mão ter saído de seu compromisso 20 minutos mais cedo até a aceitação de que não vai conseguir mesmo e iniciar as co