O bem mais precioso para um paulistano é o silêncio,
embora tenhamos apenas uma vaga ideia do que ele seja. Mesmo os maiores
exercícios de abstração são insuficientes para lembrar o que pode ser isso. O
barulho, por vezes (como agora) ensurdecedor, é como um metrônomo a nos manter
no ritmo que a cidade impõe, mesmo que seja parado no trânsito ou tentando
dormir.
Daqui do meu espaço de trabalho, por exemplo, tenho da
janela uma visão rara de árvores e jardim. Estou longe da rua e o ambiente é
tranquilo e ideal para pensar. Mas... há uma obra nos fundos. Desde que me
instalei no local, há dez meses, um prédio enormemente desproporcional ao
entorno está sendo erguido e dá uma sensação de vertigem a quem se aventura na
horta do quintal. O barulho, porém, é ininterrupto, sinfônico, onipresente.
A metrópole tem som e cheiro.
Sentada no café da Casa das Rosas outro dia, curtia o
burburinho das pessoas conversando nas outras mesas, o tipo de som gostoso para
embalar um café. De repente, um cheiro de diesel me trouxe à realidade e o
ouvido me deu a certeza: não estava viajando, estava em plena Paulista e o
agradável jardim tinha como pano de fundo um inconfundível gerador.
Este odor de combustível queimado misturado ao barulho de
motor, aliás, é a verdadeira identidade de São Paulo. Você pode estar em casa
de madrugada, em um templo, na academia de ginástica (com fone de ouvido e
tudo) e basta apenas se concentrar um pouco que lá estão eles: cheiro e som.
Um dos meus locais favoritos na cidade, o Parque Villa
Lobos, vizinho da Marginal Pinheiros, é um exemplo acabado disso. É preciso
muita concentração para distinguir o canto dos pássaros e o perfume das árvores
que, com o passar dos anos, vão finalmente deixando o antigo aterro com bosques
moldados para nos fazer quase esquecer o que está do lado de fora. Quase...
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