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Como plantar água em Itu


A situação no município de Itu é o exemplo mais contundente da falta d’água no Estado de São Paulo. A convulsão social causada pelos muitos meses sem abastecimento tem se tornado o terror do que pode acontecer se a mesma situação se concretizar na Região Metropolitana de São Paulo (a possibilidade não é infundada nem remota).

A experiência realizada no Alphavillage Refúgio Ecológico, narrada no livro “Explorar para Preservar” - publicação de 2011 de cujo projeto participei e que conta a luta pela conservação na Amazônia e na Mata Atlântica do empresário Fábio Albuquerque (dono também da Ecolog, que faz manejo florestal em Rondônia) -, é uma pequena mostra do imenso poder que a natureza tem de se recuperar, se levada a sério. E se passou justamente em Itu, onde Fábio adquiriu, nos anos 1990, uma propriedade de 75 hectares, “praticamente abandonada (...), onde só restava pasto degradado e uma plantação de pínus”, e “uma represa de mais de 600 metros de extensão”.

Despois de algumas tentativas frustradas de recuperar a área por conta própria e ver “a dificuldade de recuperar uma área desmatada e degradada”, o empresário foi procurar ajuda profissional:

“No início, eu contava apenas com um técnico, que era caseio e administrador, mas, a partir de 2000, contratei também um técnico em meio ambiente, que ajudou bastante. O processo de restauração da propriedade não foi nada fácil, já que é uma região seca e com grande variação de temperatura ao longo do dia. Além disso, foi desmatada há muito tempo, o que causou a perda da fertilidade por causa da erosão. Assim que começamos a coletar sementes, fizemos um viveiro de mudas.” (...)

“Há dois anos [2009], a SOS Mata Atlântica me incluiu no programa Clickarvore e recebi a doação de 24 mil mudas, com as quais acabei de restaurar a propriedade. Hoje, só faço manutenção e reposição.

Na mesma época, foi feita também a recuperação do lago, que estava bastante assoreado. Quando foi formado para o haras, nos anos 1970, tinha 14 metros de profundidade no leito antigo do riacho (...). Agora foi refeito como se deve: foi totalmente esvaziado e, por dois meses, máquinas retiraram terra preta que foi jogada nas áreas mais altas. As margens foram recuperadas com areia. Hoje, a presença de mata impede que seja assoreado novamente. Antes, na época seca, chegava a baixar dois metros, o que não acontece mais.

A volta da água é o resultado mais palpável do reflorestamento. O córrego que formou o lago estava seco e voltou com a umidade da floresta. A nascente do lago principal foi uma das sete que reapareceram. Quando começamos, a propriedade era abastecida com água do córrego que vinha do vizinho, a nascente que utilizamos atualmente apareceu há três anos.

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