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Saneamento adaptado às mudanças do clima é chave para bem viver

 


Pensar em adaptação do saneamento básico às mudanças climáticas, em uma semana de sol em São Paulo às vésperas do Carnaval, parece uma péssima ideia. Ninguém quer se lembrar de problemas relacionados a chuvas ou falta de chuvas, que, no caso da cidade, remete a inverno. Mas, talvez, justamente por estarmos fora da emergência, seja o melhor momento. Ainda mais porque a maior parte das adaptações necessárias também pode minimizar esse calor em ondas cada vez mais fortes.

Em “Adaptação e Saneamento - Por um setor resiliente às mudanças climáticas", publicação recém-lançada pelo Instituto Água e Saneamento (IAS), da qual participei, mostramos por que a adaptação dessa área é fundamental para garantir o bem viver nas cidades. Sem uma drenagem pensada para a nova realidade, ficaremos sem mobilidade – a parte mais visível da equação -, mas também sem abastecimento de água, sem tratamento adequado de esgotos, sem habitações de qualidade e com sérios problemas de saúde pública.

Na pesquisa realizada para a publicação, ficou claro que um conjunto e medidas precisa ser tomado urgentemente, envolvendo de legislação e políticas públicas a meios de financiamento. Obras como sistemas de coleta e tratamento de esgotos eficientes e resilientes são urgentíssimas, já que temos uma defasagem a ser superada, além de outras infraestruturas cinzas, como piscinões, por exemplo.


O que ficou evidente, porém, é a necessidade de soluções baseadas na natureza, chamadas pela nova sigla do momento SbN ou de infraestruturas verdes. Isso significa, em uma cidade como São Paulo, na qual as chuvas provocam tragédias e a falta d’água está sempre pairando, pensar em como era este espaço antes da metrópole se instalar: uma região com três grandes rios de várzeas (Tietê, Pinheiros e Tamanduateí) serpenteando uma planície para onde afluíam cerca de dois mil córregos, a maior parte deles atualmente canalizados. Mesmo com chuvas normais, as águas querem seu espaço original, imagine com os eventos extremos que vêm pela frente.


Conheço as respostas obvias. Os rios foram retificados, sem as marginais o trânsito não anda, tudo já foi ocupado. O pior é que o processo de impermeabilização do solo não cessa nunca, a cada dia mais e mais prédios gigantescos são construídos sem que se pense na drenagem urbana. Na chuva fatídica de 24 de janeiro, minha rua, que sempre enche na parte baixa, perto do Beco do Batman, conseguiu ter apartamentos inundados na parte alta, com o lençol freático subindo pelos ralos.

As mudanças não são fáceis, mas têm que ser feitas. Há várias cidades sendo adaptadas pelo mundo. Nova York tem investido em aumentar suas áreas verdes e as cidades-esponja criadas na China tem aberto espaço para as águas escorrerem e armazenarem naturalmente. Na publicação do IAS, trazemos exemplos de medidas grandes e pequenas que podem ajudar, e disponibilizamos o endereço de várias plataformas com experiências em andamento. Ficar lamentando a época das chuvas e, alguns meses depois, a de seca não vai ajudar a melhorar a situação. 

Fotos: Várzeas dos rios Pinheiros e Tietê no início do século 20 e capa da publicação do IAS.




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