Mais de cinco meses depois que abandonei abruptamente minha
até então vida para me refugiar na chácara, onde nunca pensei em morar, já não
sei o que devo fazer. Ficar de quarentena ficou fora de moda de repente, quase
ao mesmo tempo em que o país se aproxima de 100 mil mortos pela doença e que os
índices de contaminados sobem vertiginosamente. Deve haver alguma coisa no
isolamento que embotou minha capacidade de entendimento e os remédios da vez
(cloroquina, invermectina e agora ozônio via retal) não são para esse mal. Estou
meio perdida, algo me escapou sem que percebesse.
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Esperando o tempo passar. |
Não que eu acredite que tenha que seguir a boiada (será que
posso falar isso?), mas a sensação de ficar para trás não é boa. Será que sou
preguiçosa e não quero procurar novos desafios? Será que não ter um chefe me
obrigando a voltar para o escritório é sintoma de fracasso? Será que meus amigos
não são bons porque não me convidam para festas, ou sou egoísta por não os estar
convidando para nada? Vou me tornar uma caipira que não sabe andar de metrô ou
no shopping center? Vivo em uma realidade paralela e ninguém teve coragem de me
contar?
Pelo pouco entendimento que me resta, dizer que a pandemia
é uma fatalidade ainda pode. Que atinge o mundo todo e isso é horrível também.
Mas mencionar que política tem a ver com o tamanho da tragédia do país ficou old
fashioned – ou antiquado mesmo, em bom português. Afinal, isso é só questão
de opinião e opinião só é relevante (ou ciência) quando se trata de receitar medicamentos
para a Covid-19. Dizer que a vacina vai chegar rapidinho e tudo vai voltar ao
normal não só pode como é o esperado. Qualquer coisa diferente disso é ser do
contra. Devo estar enganada, mas o maior crime para um brasileiro desde o
início do ano passado é exatamente ser do contra. Parece que dá um superpoder
ao vivente e o que ele prognostica acontece. Se todos pensassem positivo,
estaríamos bem e eu não estaria com todos esses dilemas.
Tento recorrer à minha bolha no Twitter ou Facebook, mas é
só não resistir à tentação e olhar os comentários – mais uma prova de
insanidade que me acomete com cada vez mais frequência – e vejo que esta bolha
é realmente muito pequena e contaminada com pensamentos negativos, baseados em
crenças démodé (a gente muda a língua, mas o significado é sempre o
mesmo) sobre defender a lógica, a ciência, os direitos humanos, a coletividade.
Somos um povo de pouca fé e quase nenhuma influência, como mostram as pesquisas
de opinião divulgadas quase todos os dias.
Se é que consigo interpretá-las. Na minha confusão mental,
quando a gente acha algo razoável, é porque está mais para bom do que para mal.
Então, não adianta especular que são poucos (entre 15% e 30%) os que avaliam bem
a gestão federal. Somos bem minoritários os que, como eu, acham que vivemos uma
realidade inaceitável. Mas deve ser apenas delírio do isolamento. Radicalismo
de quem inveja os que aproveitam a vida enquanto fico aqui vendo o tempo
passar.
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