Uma Espanha recém-saída de uma Guerra Civil cruel, na qual
o fascismo venceu, cercada por uma guerra mundial tão maligna quanto (com
resultados ainda incertos mesmo em 1944) e uma ditadura que ainda perduraria por
décadas. Este é o pano de fundo de O Labirinto do Fauno, livro escrito a
partir do filme de mesmo nome do cineasta Guillermo del Toro, assinado por ele
e a escritora e ilustradora Cornelia Funke. Aliás, suas ilustrações lindas e
sombrias, nesta edição bem especial da Intrínseca, fazem jus ao que encontramos
no texto.
Mas minha missão, para nosso Clube Feminino de Leitura
(CFL), foi falar do personagem – secundário na trama – Pedro, irmão da
incansável governanta Mercedes e brindado com o “final glorioso” de assassinar
o vilão Vidal com um tiro na cabeça.
Mas quem é Pedro? É o líder de um grupo de guerrilheiros
resistentes à sanguinária ditadura franquista, que se esconde na floresta das
milícias oficiais do governo, as quais tenta sabotar. Chefiados pelo capitão
Vidal, os soldados que tudo podem, perseguem os dissidentes, suas famílias e o
povo pobre em geral, do qual roubam até os poucos provimentos que teriam direito
durante o racionamento imposto pelo governo central.
Idealistas, Pedro e seus companheiros esperam que os Aliados
venham socorrê-los assim que a guerra acabar: “Rússia, Inglaterra, Estados
Unidos... Eles vão nos ajudar – disse Pedro, enfim. – Assim que derrotarem os
fascistas alemães, vão nos ajudar a derrotar os fascistas aqui na Espanha.
Franco apoiou Hitler, mas nós apoiamos os Aliados. Muitos de nós morreram ajudando
a Resistência. Sabotamos as minas de tungstênio da região da Galícia, que eram
indispensáveis às fábricas de armas alemãs... Acham que os Aliados vão se
esquecer disso?”
“Sim eles vão esquecer”, pensou com razão outro personagem,
o doutor Ferreiro, como a História nos diz hoje. Sabiamente, o médico que
tombou sem se render à desumanidade que o cercava, tinha medo de que “as causas
boas nunca ganhassem, afastando o mal apenas por um breve momento”. O fim de Pedro,
não sabemos, mas deve ter acabado seus dias morto em combate, preso e torturado
nas prisões franquistas ou se submeteu ao sistema e sobreviveu para, na
velhice, ver a Espanha se reerguer como país democrático (porém ainda
monarquista) a partir da morte de Franco, em 1975.
Tenho simpatia por Pedro e seus semelhantes que resistiram
e ainda hoje resistem às injustiças em busca de um mundo melhor. São geralmente
destemidos e enfrentam forças quase sempre muito superiores a eles em nome de uma
vida melhor para pessoas impotentes, mas às vezes também ignorantes, covardes e
coniventes com o que as oprime. Por isso, são todos, quase sempre, perdedores. Em
O Labirinto do Fauno, a esperança existe apenas no escapismo do conto de
fadas (como fez Ofélia entrando no Labirinto) e na pequena vitória sobre o
tirano de pouco escalão que logo deve ter sido substituído. A luta, portanto, é
eterna e incerta.
Se é assim, por que, então, ainda temos “Pedros” (e
Mercedes e doutores Ferrero) no mundo? A resposta foi dada pelo próprio Pedro
quando Mercedes questionava seu papel de espiã dentro da casa de seu algoz: “E
se o doutor tiver razão e não conseguirmos vencer?”
Disse Pedro: “Então pelo menos teremos dificultado as coisas para esse desgraçado”.
Foto da @walscaramella
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