A sensação no mirante era de abandono diante da emoção de ver por inteiro a paisagem já entranhada aos pedaços do chão. Mas havia ainda um outro abandono, este incômodo, do local mau cuidado que servia de base para a contemplação da planície de palmeiras e praias infinitas. Um espaço turístico, mas de terra esburacada, fios soltos, construções meio abandonadas.
De repente, a menina, algo como cinco anos, chega do nada e me oferece uma rosa feita de palha. “Um presente para você”, diz olhando para o chão e voz envergonhada de quem foi mandada fazer algo que a deixava desconfortável. Pela primeira vez, olho ao redor e vejo, por traz de algumas árvores, duas mulheres sentadas no chão e dedicadas à produção das flores, cercadas de crianças e embalagens de copos e quentinhas espalhadas com seus materiais de trabalho.
Tão sem-graça quanto a garotinha, aceito o “presente” que me trouxe à realidade, vou até o carro, pego um dinheiro, e me aproximo das mulheres. Uma das amigas que estavam comigo já estava praticamente interrogando as mulheres sobre o que as crianças faziam por lá, se não vão para a escola. Mais constrangida eu fico. Respondem que, sim, elas vão, mas por conta da covid, apenas uma semana sim e outra não. Ofereço o dinheiro esperado e perguntamos se sabiam onde ficava a Fonte Milagreira, que deu origem ao nome da cidade de São Miguel dos Milagres, que era o que procurávamos até encontrar o mirante.
Uma das mulheres nos ensina o caminho, mas passa um sermão, “santo não faz milagre e Deus não aprova esse tipo de desfeita”, e nos desaconselha a ir até lá. Recitava o que deve ouvir de algum pastor, que possivelmente promete milagres dos quais ele é o intermediário e pode cobrar por eles.
Achamos a fonte, que é uma gruta construída como um minitemplo, com um poço fechado com um vidro e um altar para o santo. Ao lado, uma bica onde moradores e turistas/fiéis enchem garrafas d´água. É mal sinalizada, não tem lugar para estacionar e fica junto a uma fábrica de móveis de madeira que funciona ao ar livre. Tiramos nossas fotos, algumas das amigas com alguma devoção fizeram orações e pegaram água, e fomos para a praia, que nunca decepciona por essas bandas.
Para quem se interessa, essa fonte existe desde a ocupação holandesa, por volta de 1635, quando moradores da região fugiram à procura de um abrigo onde pudessem observar o movimento dos invasores e fundaram o povoado de Freguesia Nossa Senhora Mãe do Povo. Depois de alguns anos, um pescador encontrou na praia uma peça de madeira coberta de musgo e algas e foi limpá-la na fonte, quando descobriu ser uma imagem de São Miguel Arcanjo. Ao lavá-la, ele ficou curado de um grande problema de saúde. A notícia se espalhou e criou a fama do lugar que passou a ser conhecido como São Miguel dos Milagres.
Quem me conhece sabe da importância que participar de um clube de leitura tem na minha vida. Especial para mim e para as demais membras, o Círculo Feminino de Leitura-CFL, ao invés de se tornar rotina, foi ganhando maior espaço em nossas vidas ao longo do tempo e transfomou nossa maneira de ver o mundo. Por isso, ao receber da Nivia, uma de minhas companheiras de CFL, uma foto do livro Clubes de Leitura – Uma aposta nas pequenas revoluções (Solisluna Editora), de Janine Durand e Luciana Gerbovic, fiquei com coceira nos olhos e fui correndo comprar. As autoras escrevem a partir de suas experiências de mediadoras de clubes de leitura e abordam o potencial da literatura como caminho para libertação pessoal. Advocam que a literatura é um Direito Humano, mas pouco respeitado no Brasil. As duas são articuladoras do Programa Remição em Rede, que fomenta clubes de leitura em unidades prisionais para remição da pena por meio da leitura. Trazem depoimentos tocantes de pessoas transformadas pelo...
Comentários
Postar um comentário