Não é normal ter mais de 11 milhões de vizinhos. Isso nunca aconteceu na história do homem e tentamos nos adaptar a essa realidade para a qual a seleção natural está apenas começando. Quem sobreviverá? Com certeza aqueles que conseguem suportar um grau elevado de stress, acham normal ou pelo menos convivem bem com ser sozinhos na multidão, além dos felizardos em cuja carga genética não haja fragilidade no sistema respiratório.
Acredito ser um desses seres com capacidade de adaptação, mesmo sem ser entusiasta desse estilo de vida. Tirando períodos exageradamente depressivos (como em época de chuvas torrenciais), até consigo passar longos períodos no trânsito sem ter vontade de matar ou morrer e acredito que meu pulmão tenha a aparência apenas de um fumante leve (embora nunca tenha colocado um cigarro na boca). Mas não consigo achar normal sair à rua e não encontrar ninguém conhecido. E, ao mesmo tempo, conhecer tanta gente que, ao finalmente ver um rosto familiar no supermercado do bairro, não saber se a pessoa mora no meu prédio, tem um filho na mesma escola dos meus ou participamos de um mesmo evento profissional.
No mundo normal, dos 50% da população que vive no campo ou dos demais, sei lá, talvez 48%, que vivem em pequenas, médias e até grandes cidades, a possibilidade de seu vizinho de porta ter filhos na mesma escola que os seus e te encontrar de vez em quando em situações profissionais é grande. Gostaria de levar meu filho ao médico e, ao chegar lá, reconhecer o dito cujo como filho do “seu” José, que vendia calçados na rua debaixo e neto da “dona” Maria, que tomava chá com a vovó. Mas isso nunca acontece.
Há até uma máxima segundo a qual “o mundo é grande, mas a burguesia é pequena”, que faz com que um grupo de pessoas acabe sempre encontrando seus pares em reuniões profissionais ou eventos sociais: as pessoas sempre conhecem, trabalham ou são parentes de alguém que você conhece, mas para mim isso apenas confirma a regra: essa pessoa que acabou de conhecer será mais um que você poderá citar em futuros encontros, mas será mais um a passar rapidamente, antes que tenha a oportunidade de saber se poderiam ou não ser bons amigos.
Não é que não se tenha amigos. Apenas é mais difícil cultivar a camaradagem e a intimidade, já que a distância, a falta de tempo e o trânsito impedem encontros frequentes e tenham levado embora, há muito tempo, o costume de se visitar ou reunir em ocasiões especiais: ninguém normal vai à casa de ninguém sem ser convidado e ninguém normal convida ninguém se não estiver com tempo e dinheiro para preparar uma recepção que não cause constrangimento.
Por outro lado, não se pode dizer que as pessoas não estejam em contato, só muda o modal: antes, para se cumprimentar um amigo no aniversário, se ia à casa dele. Com o tempo, isso foi substituído por um telefonema e hoje por um recadinho no face book.
Acredito que nos adaptamos rapidinho. E, num mundo onde quem reclama é saudosista e chato e acaba marginalizado, é melhor mesmo procurar o lado positivo da coisa. Afinal, Darwin já explicava que “evoluir” não significa obrigatoriamente melhorar, apenas sobreviver.
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