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Mostrando postagens de agosto, 2024

Livrai-nos do Mal

  Houve uma movimentação no grupo de WhatsApp do prédio da Neise na última quinta-feira para saber por que o apartamento dela estava interditado. Caso chegassem mais perto da porta, os vizinhos veriam que, no meio das fitas de isolamento de área, havia uma plaquinha indicando Hotel Towneley Arms. Se tivessem aberto a porta, teriam se deparado com uma cabeça de homem sobre a mesa, cercada por sete mulheres – ali representadas por bonecas – suspeitas do assassinato. A arma do crime, um machado ensanguentado, estava ao lado da parte do corpo exposta. Na parede da sala, um esquema daqueles de filmes policiais trazia Jamie Spellman no centro, com as informações sobre a vítima e as possíveis assassinas ao redor. Essa mistura de cena de crime com delegacia de polícia foi planejada pela Neise para nossa reunião do Círculo Feminino de Leitura – CFL sobre o livro Livrai-nos do Mal, da inglesa Rose Wilding. Pela primeira vez em nosso grupo, à exceção de nossa anfitriã/inspetora de polícia, ning

O lindo Jardim Botânico de São Paulo

  Um dos parques mais antigos de São Paulo, o Jardim Botânico é também um dos mais bonitos. Fundado em 1928, a partir da implantação de um projeto de botânica para a cidade, pelo naturalista Frederico Carlos Hoehne, o local tem um paisagismo maravilho, trilhas bem-sinalizadas e um orquidário daqueles de gastar o dedo tirando fotos. Abriga, ainda, o Instituto de Botânica e o Museu Botânico de São Paulo, onde se encontram amostras de plantas da flora brasileira e informações sobre diversos ecossistemas do Estado de São Paulo. Fica dentro do Parque Estadual Fontes do Ipiranga, que engloba também o Zoológico de São Paulo, e é o maior fragmento de Mata Atlântica em área urbana da Região Metropolitana de São Paulo. Estive lá algumas vezes para entrevistas no Instituto de Botânica, mas fazia bastante tempo que não visitava, principalmente porque a Água Funda, na Zona Sul, fica um pouco longe de onde moro. Talvez seja por isso que não soubesse que o Jardim Botânico (junto com o Zoológico e o Z

Calorão no inverno parece bom, mas não é

Lembro de acordar e sentir cheiro de orvalho, encontrar o chão do quintal e as calçadas molhadas de manhãzinha. Era assim todos os dias em São Paulo. E lembro de como odiava os dias garoentos do outono e o frio no meu aniversário, no final de julho. E de reclamar durante agosto inteiro de me levantar cedo para ir para a escola. Detestava ter que me agasalhar demais, às vezes com toca e luvas, e ainda me sentir gelada. Mas tudo isso foi há muito tempo, quando eu era criança. Já na faculdade de Geografia, aprendi com a professora Magda Lombardo o que eram as ilhas de calor e como a urbanização levou embora o orvalho e a garoa da cidade, aumentando sua temperatura. Nada que se compare, porém, com este inverno atípico que assistimos agora, sem saber se ele é apenas excepcional ou o novo normal. A questão é que, para a maior parte das pessoas, que gostam de sol e calor, este tem sido um inverno bom, e estou entre elas. É delicioso não precisar usar casacões, poder dormir, no máximo, com

Parque Buenos Aires, em Higienópolis: cada bairro deveria ter o seu

  Trabalhei por ano em Higienópolis, frequento o bairro, mas nunca tinha entrado no Parque Buenos Aires. Aliás, ainda pensava nele como uma praça. Para quem só conhecia o local de passar por fora, é menorzinho do que imaginava e mais bonito. Fiquei encantada com as esculturas - uma delas, Emigrantes, do Lasar Segall, já vale a visita. Durante a semana, é um paraíso das babás do bairro, passeando com carrinhos de bebês ou com crianças pequenas no parquinho. E tem espaço para cachorros. Para quem gosta de caminhadas, é um pouco pequeno, está mais para um convite para descanso e contemplação. Daquelas áreas verdes que cada paulistano deveria ter perto de casa para ir a pé, mas permanece como privilégio de bairros ricos.

Notícias sobre mudança do clima continuam péssimas

  Fazia bastante tempo desde que estive em um evento sobre mudanças climáticas. Como imaginava, as notícias continuam as mesmas – só que piores. O fato de o ano passado ter sido o mais quente da história dos humanos no planeta – e 2024 se candidatar para bater o recorde – elimina possibilidades de otimismo. As enchentes no Sul, o fogo no Pantanal, as secas na Amazônia e no Nordeste são a cereja do bolo. Como disse Márcio Astrini, do Observatório do Clima, na mesa sobre o tema, no Seminário USP Pensa Brasil, nesta semana, as pesquisas indicarem que 95% da população brasileira saber o que são mudanças climáticas e boa parte se importar com elas não significa, na prática, ser uma prioridade para a sociedade. Principalmente, porque os brasileiros, principalmente os pobres, têm coisas mais urgentes para se preocupar, como ter uma casa, um emprego e saúde e escola para seus filhos. Entender que já ultrapassamos o aumento de 1,5º C na temperatura média do planeta e que a situação deve pio

O sobrenome e o patriarcado

Um dos maiores símbolos do patriarcado, que me deixa muito irritada, é a transmissão do sobrenome. Considero um desaforo para as mulheres. Mesmo homens, e são muitos, que simplesmente desaparecem da vida de seus filhos, deixando a mãe se virar sozinha, transmitem seus nomes como herança, caso eles constem na certidão de nascimento. Colocar em uma criança também o sobrenome da mãe – como fizemos eu e meu marido com nossos filhos – é uma atitude bacaninha, mas ele vai sumir na próxima geração. Aliás, na prática, pouquíssimas pessoas usam o nome materno, o costume é sermos conhecidos apenas pelo último nome. Meus pais nem se deram a esse trabalho, só tenho o sobrenome do meu pai. No meu caso, nem nome duplo deram, como no caso dos meus irmãos, por considerarem que, ao me casar, ficaria com um nome muito grande. Euzinha, porém, tenho uma sugestão para resolver essa injustiça: meninas seguiriam a linhagem materna e meninos a paterna. Sei que é uma proposta controversa e adianto que não tenh

Clubes de leitura: revoluções individuais a partir dos livros

Quem me conhece sabe da importância que participar de um clube de leitura tem na minha vida. Especial para mim e para as demais membras, o Círculo Feminino de Leitura-CFL, ao invés de se tornar rotina, foi ganhando maior espaço em nossas vidas ao longo do tempo e transfomou nossa maneira de ver o mundo. Por isso, ao receber da Nivia, uma de minhas companheiras de CFL, uma foto do livro Clubes de Leitura – Uma aposta nas pequenas revoluções (Solisluna Editora), de Janine Durand e Luciana Gerbovic, fiquei com coceira nos olhos e fui correndo comprar. As autoras escrevem a partir de suas experiências de mediadoras de clubes de leitura e abordam o potencial da literatura como caminho para libertação pessoal. Advocam que a literatura é um Direito Humano, mas pouco respeitado no Brasil. As duas são articuladoras do Programa Remição em Rede, que fomenta clubes de leitura em unidades prisionais para remição da pena por meio da leitura. Trazem depoimentos tocantes de pessoas transformadas pelo